De um lado, pacientes esperando por cirurgia há dias acomodados em maca no Hospital João XXIII; de outro médicos indignados com as seguidas suspensões das cirurgias ortopédicas e ociosidade do Hospital Maria Amélia Lins. A Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados realizou ontem (29/05) uma Visita Técnica às duas instituições, ambas vinculadas à Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig), em Belo Horizonte. O objetivo da diligência era verificar in loco a situação estrutural e assistencial dos dois hospitais. A iniciativa foi da deputada federal Ana Pimentel (PT-MG), médica sanitarista, ex-secretária de Saúde de Juiz de Fora e integrante da Comissão de Saúde e foi acompanhada pelo vereador Bruno Pedralva (PT-BH).
Apesar de a direção da Fhemig ter apresentado um panorama de normalidade no atendimento – com funcionamento regular das cirurgias e ausência de superlotação —, a realidade denunciada por pacientes, médicos e técnicos contrasta com os dados oficiais. Relatos emocionados e denúncias de precarização se multiplicaram ao longo da visita, que teve início no Hospital João XXIII.
Realidade não sustentada
A deputada Ana Pimentel afirma que os dados apresentados pela direção da Fhemig não se sustentam diante da realidade dos corredores. “O que vimos foi um esforço deliberado para mostrar um hospital que não condiz com o relato dos pacientes e trabalhadores. É um cenário gravíssimo para a urgência e emergência de Belo Horizonte que impacta todo o estado de Minas Gerais ”, comenta.
A sensação de que a visita havia sido “maquiada” para esconder os problemas foi reforçada por um paciente, que interrompeu a caminhada da Comissão de Saúde pelo hospital para denunciar que foi retirado do corredor, onde aguardava atendimento por dois dias, apenas na véspera da inspeção.
“Estava no corredor até ontem a noite. Hoje me transferiram para a sala de espera da cirurgia por causa da visita de vocês. Limparam tudo, tiraram as macas e as luzes, que indicam a lotação e ficam sempre no vermelho, hoje estão verdes. Tem gente esperando cirurgia desde o dia 11 e ninguém dá uma resposta”, conta Laoene Santos, de 23 anos, que se recupera de um acidente de moto.
Uma servidora procurou a comissão e denunciou a sobrecarga e a falta de estrutura básica. “Colegas estão trabalhando doentes. Só queremos que olhem pela gente”, diz Janaína Silva, técnica de enfermagem que trabalha há 15 anos no hospital. Outro servidor relata precariedade, com banheiros interditados, portas caindo e falta de estrutura para a assistência aos pacientes internados ou aguardando cirurgia.
Corredores lotados com leitos ociosos
No Hospital Maria Amélia Lins, o clima também é de indignação. A médica Andréia Fontenele diz que não faz sentido ter gente aguardando cirurgia no corredor do HPS quanto leitos estão vagos no Hospital Maria Amélia Lins. “Temos enfermarias fechadas, salas de cirurgia novas, completas, que estão paradas, prontas para serem entregues para a nova instituição gestora. Uma decisão política que lesa o usuário é crime. É um crime doloso”, frisa a médica.
Os servidores também denunciaram uma possível intenção do governo estadual de reduzir o atendimento público e transferir estruturas para a iniciativa privada. “Estamos vendo o dinheiro público ser usado para reformar e equipar hospitais para depois entregá-los à gestão privada”, narra Deonara.
A deputada Ana Pimentel diz que a Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados irá reunir em um documento os dados apresentados pela direção do Hospital João XXIII e pelos sindicatos dos servidores da saúde. “Vamos acompanhar a produção do relatório, reunir mais dados numéricos e intensificar a mobilização para a abertura do Amélia Lins, comprovando que ele faz falta para a assistência e que está impactando na vida dos usuários do SUS. A saúde pública precisa ser fortalecida, não desmontada”, afirma, lembrando que a Comissão de Saúde da Câmara tem a função de fiscalizar e pode, em seu relatório, pedir o acompanhamento do Ministério Público e até a instalação de ação penal.
